quinta-feira, 24 de junho de 2010

O BATERISTA

Vamos colecionando histórias pela vida. Algumas não têm nada a ver com bipolaridade, mas são tão interessantes que a gente não esquece.

Patrocinávamos um cantor que era uma beleza. O cara aparecia no palco e a galera – quase 100% mulheres – entoava o coro: ôooouuu! E, por onde passava, haja seguranças para garantir a integridade da camisa bem passada, ou do cabelo engomado. No meio da trupe viajava o baterista, que pouca gente notava, pois não havia solo do instrumento e ele ficava lá atrás, meio que mal iluminado. Mas, em matéria de máscula beleza, punha o cantor no chinelo.

Foi em Porto Alegre que uma cidadã solitária, sentada na fila do gargarejo, reparou nas batutas do sujeito. E mais não fez. Paixão à primeira vista, ela comprou o mesmo lugar nos outros dois shows que faltavam e, apesar de não ser das mais novas, deu uma de tiete no lobby do hotel onde estávamos hospedados, cercou o baterista, pediu autógrafo e jurou amor eterno.
__ Agora eu não posso conversar com você. Vamos viajar pra São Paulo. Estamos em cima da hora.
__ Como é que eu posso falar com você? Me dá um telefone.
__ Ô Garganta! Cê sabe o telefone lá do Anhembi?
__ Nesse cartãozinho aqui tem, ó.
__ Toma esse cartão. Nós vamos ficar lá duas semanas. Me liga antes do show, ali pelas oito da noite.
No primeiro dia, pontualmente às sete e trinta, o telefone tocou.
__ Ligação pro Nonô, ele já chegou?
__ Tô aqui. Quem é?
__ É uma mulher. Disse que é de Porto Alegre.
__ Caramba! Será que é ela?
E era. O telefonema se repetiu alguns dias, com a pontualidade de sempre. E o Nonô começou a ficar com a cabeça virada.
__ Dionísio, não é possível um negócio desses. Eu tenho que ir atrás dessa mulher!
__ Então vai, ora essa. Você não tem problema de grana. Pega um avião aqui de manhã, volta de tarde.
__ Mas será que dá tempo?
__ Claro que dá, cara. Tem vôo toda hora daqui pra Porto Alegre. Você sai cedinho e volta ali pelas cinco. Quando for por essa hora você já está no Anhembi. O show não começa antes das dez, mesmo.
__ Rapaz, se eu não voltar a tempo o bonitão me mata.
__ Acontece que você vai voltar a tempo, para com isso...

Cabeça feita, decisão tomada. Lá se foi o nosso herói, armado de todas as batutas, pro aeroporto de Congonhas, às 6 da manhã. Acontece que deu uma pane e o avião ficou parado na cabeceira da pista. O pobre homem, que já tinha medo de voar, se borrou todo.
__ Aeromoça, eu preciso descer.
__ Aqui não pode, senhor.
__ Mas eu vou ficar atrasado, eu não posso me atrasar, eu quero descer.
__ Aqui não pode, senhor. Estamos na cabeceira da pista. O comandante sabe o que faz. Se não der para decolar, ele vai voltar e o senhor desce, OK? Mas não deve ser nada não. Daqui a pouco estamos voando.
O Nonô olhava pela janela do avião, depois para as luzes de advertência, e olhava de novo, as mãos suadas, foi quando avisaram que estava tudo legal e lá se foi a potente aeronave levando o nosso baterista para Porto Alegre.

Desligados os motores, ele foi um dos primeiros a descer. Sabe aqueles caras que não sabem esperar, vão empurrando uns e outros na ânsia de sair? Pois é. Ao avistar a morena apaixonada, foi logo perguntando:
__ Cê tá de carro aí? Cê tá de carro aí?
__ Coloquei no estacionamento.
__ Vamos lá, vamos lá.
A coitada seguia arrastada pelo braço, sem entender a razão de tanta pressa.
Entraram no carro, machão ao volante e um nervosismo que não tinha nada de musical.
__ Onde é que tem um motel aqui?
Intimidada daquela forma, a pobre moça quase não conseguiu balbuciar uma resposta.
__ Eu não sei. Eu sou casada. Eu moro em Caxias do Sul.

Foi assim que o Nonô pegou a primeira estrada que viu pela frente e foi parando, de posto em posto de gasolina, perguntando bem alto:
__ Ô cara, aonde é que tem um motel por aqui, hein?
__ Faz o seguinte, anda mais uns cinco quilômetros que tem um retorno. Aí o senhor faz a volta, porque é do outro lado. É pertinho. Chama Motel My Love.

Uma acelerada mais rápida, uma tensão a mais para não errar o retorno e a mocinha, coitada, nem olhava direito o rosto do motorista que tanto sonhara. O My Love não tinha nem uma estrela. Era uma tragédia, a começar pelo cheiro de mofo. E o Nonô olhando no relógio todo o tempo, com medo de se atrasar para o show da noite. Foi tirando a roupa bem depressa, ela no canto desabotoando timidamente a blusa e... quando ele baixou a cueca, ejaculação precoce! Já pensou? A coitadinha não ganhou nem um beijo na boca, ficou ali aturdida, olhando aquele baterista tão bonito, tão másculo, tão enganadoramente romântico.
__ Deu tudo errado hoje. S’imbora.

Quanto ao show, deu tudo certo.

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