quarta-feira, 30 de junho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (2)

__ O seu diagnóstico como portador de transtorno bipolar ocorreu em uma época em que a doença era pouco conhecida. Após saber do distúrbio você passou a entender melhor algumas de suas atitudes e sentimentos?

Infelizmente, não. Eu tinha vinte e poucos anos e morava em Gov. Valadares. Meu médico morava e me tratava em Belo Horizonte. E não me disse o que eu tinha imediatamente. Para todos os efeitos, eu estava me tratando para curar uma depressão séria. Não me lembro exatamente quando foi que ele usou a expressão “psicótico maníaco depressivo”. Bipolar foi um termo que eu ouvi muito tempo depois. De qualquer maneira, eu não sabia interpretar atitudes e sentimentos como hoje. Eu só sabia que estava deprimido, ou alguém me falava que eu estava eufórico. A euforia é mais difícil de perceber. A gente fica achando que é o máximo, não pode admitir que esteja doente.

terça-feira, 29 de junho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM

Depois que lancei o livro Crônicas de um bipolar, algumas perguntas vão e voltam, nas entrevistas que eu dou à imprensa.
__ Como surgiu a idéia de escrever este livro?
Ao longo de 59 ou 60 anos de vida (hoje tenho 62), acumulei muitas experiências e ainda tenho muitas histórias para contar, algumas bem curiosas e até engraçadas. Eu quis escrever essas crônicas, mas então pensei: quem é que vai se interessar em comprar um livro com histórias de um desconhecido?

Eu já havia escrito antes um livro sobre ética (O Capital Moral ou a falta dele – Ed. Qualitymark), gastei mais de 2 anos fazendo pesquisas para terminar, deu um trabalho danado, e não vendeu nem mil exemplares. Acho que a ética não dá muito Ibope neste país... Por outro lado, escrever é muito edificante, mas ninguém vive de brisas.

Foi então que pensei em revelar a minha bipolaridade, um assunto que está na moda. Talvez venda, pensei eu. Estou sendo sincero, como é comum aos bipolares – a motivação foi financeira. Porém, se alguns coleguinhas não perderem seus empregos ou a chance de empregos porque os empregadores leram este livro, será uma vitória. Se alguns bipolares sujeitos a freqüentes crises, porém resistentes a tratamentos, começarem a se tratar adequadamente, também.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

VAMOS DISTRAIR UM POUCO: COFRINHO À MOSTRA

Você provavelmente assistiu esse filme, ou pelo menos ouviu falar. Numa pequena cidade do interior da Inglaterra, sob o lema de “informação, diversão e amizade”, um grupo de senhoras se reunia no Instituto das Mulheres, ouvindo palestras sobre a história das meias, como fazer cobertores, tudo que você sempre quis saber sobre brócolis e outras banalidades.

Até que o marido de uma delas morreu de leucemia e resolveram angariar fundos para o hospital local, que estava em petição de miséria. A idéia era fazer um calendário com doze mulheres do Instituto, uma em cada mês. Fotografá-las assando bolos, tricotando, ou o que mais costumassem fazer. Mas... nuas.

Elas entraram na dieta, fizeram ginástica, a notícia se espalhou e ficaram tão famosas a ponto de serem convidadas para um programa de TV em Hollywood, servindo de inspiração a muitas mulheres de meia idade pelo mundo afora. O hospital daquela cidadezinha agradece até hoje.

Pois bem, aconteceu em São Paulo, numa dessas super clínicas de estética e beleza. Um grupo de damas da melhor idade, que freqüentava a clínica regularmente, resolveu imitar as inglesas e fazer também o seu calendário, com um motivo não menos nobre: o netinho de uma delas sofria de uma doença difícil de curar – era preciso financiar as pesquisas para o tratamento.

Tomada a decisão, a clínica foi chamada a colaborar, a gerente chamou o atendimento da sua agência de publicidade que, sabendo do assunto, já carregou consigo um diretor de arte e um fotógrafo.
__ Trabalho voluntário, trabalho voluntário.

A reunião aconteceu num daqueles apartamentos cheirando a quatrocentos anos dos jardins de São Paulo. Lá estavam todas elas, inclusive a vovó do netinho doente. Só que tinha um problema: enquanto as inglesas eram senhoras de meia idade, ali pelos 40, 50 anos, talvez um pouco mais, aquele grupo da paulicéia já tinha dobrado o Cabo da Boa Esperança há muito tempo. Eram todas beneficiárias do Estatuto do Idoso.

Então, pensando em uma frase lapidar do filme inglês, “o último estágio da flor é o mais glorioso", diretor de arte e fotógrafo passaram a estudar ângulos e detalhes cenográficos que pudessem mascarar os maus tratos causados pelo tempo. Foi quando a nossa vovó levantou-se e perguntou:
__ Mas vai aparecer o cofrinho?

domingo, 27 de junho de 2010

CADA CASO É UM CASO

No tratamento da bipolaridade, vários medicamentos podem ser utilizados, mas sempre com acompanhamento médico. Para mim, por exemplo, o lítio e o tegretol funcionaram muito bem, sem efeitos colaterais.

Mas vejam o que diz a minha filha:
__ No meu caso o lítio não fez bem. Foi ruim para a minha tiróide e me deu muita tremedeira. Estou tomando um remédio que é também recomendado para quem tem ataques epiléticos, que se chama Lamictal (Lamotrigine). A insônia também é uma característica forte, pelo fato de que a nossa cabeça não para de pensar nem um minuto. Para isso eu tomo Trazodone (Desyrel, Beneficat, Deprax, Desirel, Molipaxin, Thombran, Trazorel, Trialodine, Trittico). Para depressões eu tomo Sertraline (Zoloft).

Só para ficar bem claro que não pode haver auto-medicação no nosso caso.

sábado, 26 de junho de 2010

VOCÊ SE CASARIA COM UM BIPOLAR?

Meu tio é bipolar, minha filha também. O fator genético é evidente. E agora? Imagine que, há uns anos atrás, a gente era chamado de psicótico-maníaco-depressivo. Você já imaginou pedir um emprego com esse nome? Já imaginou a cara do empregador?

O preconceito seria bem menor se todos soubessem que os bipolares podem ter características muito positivas, para o trabalho e para a vida. Criatividade, muita energia, ousadia, iniciativa, autoconfiança e sinceridade são algumas delas. Quem tem o transtorno é que comanda. Se recusar os tratamentos mais adequados, pode passar do positivo ao negativo: inconseqüência, ansiedade, irritabilidade, grande consumo de álcool e envolvimento com outras drogas, dificuldades de relacionamento, etc.

Mesmo bem tratados, nós estamos sujeitos a todas as emoções, mas não precisamos chegar aos limites que prejudicam, muito menos ficar eufóricos ou deprimidos.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

O BATERISTA

Vamos colecionando histórias pela vida. Algumas não têm nada a ver com bipolaridade, mas são tão interessantes que a gente não esquece.

Patrocinávamos um cantor que era uma beleza. O cara aparecia no palco e a galera – quase 100% mulheres – entoava o coro: ôooouuu! E, por onde passava, haja seguranças para garantir a integridade da camisa bem passada, ou do cabelo engomado. No meio da trupe viajava o baterista, que pouca gente notava, pois não havia solo do instrumento e ele ficava lá atrás, meio que mal iluminado. Mas, em matéria de máscula beleza, punha o cantor no chinelo.

Foi em Porto Alegre que uma cidadã solitária, sentada na fila do gargarejo, reparou nas batutas do sujeito. E mais não fez. Paixão à primeira vista, ela comprou o mesmo lugar nos outros dois shows que faltavam e, apesar de não ser das mais novas, deu uma de tiete no lobby do hotel onde estávamos hospedados, cercou o baterista, pediu autógrafo e jurou amor eterno.
__ Agora eu não posso conversar com você. Vamos viajar pra São Paulo. Estamos em cima da hora.
__ Como é que eu posso falar com você? Me dá um telefone.
__ Ô Garganta! Cê sabe o telefone lá do Anhembi?
__ Nesse cartãozinho aqui tem, ó.
__ Toma esse cartão. Nós vamos ficar lá duas semanas. Me liga antes do show, ali pelas oito da noite.
No primeiro dia, pontualmente às sete e trinta, o telefone tocou.
__ Ligação pro Nonô, ele já chegou?
__ Tô aqui. Quem é?
__ É uma mulher. Disse que é de Porto Alegre.
__ Caramba! Será que é ela?
E era. O telefonema se repetiu alguns dias, com a pontualidade de sempre. E o Nonô começou a ficar com a cabeça virada.
__ Dionísio, não é possível um negócio desses. Eu tenho que ir atrás dessa mulher!
__ Então vai, ora essa. Você não tem problema de grana. Pega um avião aqui de manhã, volta de tarde.
__ Mas será que dá tempo?
__ Claro que dá, cara. Tem vôo toda hora daqui pra Porto Alegre. Você sai cedinho e volta ali pelas cinco. Quando for por essa hora você já está no Anhembi. O show não começa antes das dez, mesmo.
__ Rapaz, se eu não voltar a tempo o bonitão me mata.
__ Acontece que você vai voltar a tempo, para com isso...

Cabeça feita, decisão tomada. Lá se foi o nosso herói, armado de todas as batutas, pro aeroporto de Congonhas, às 6 da manhã. Acontece que deu uma pane e o avião ficou parado na cabeceira da pista. O pobre homem, que já tinha medo de voar, se borrou todo.
__ Aeromoça, eu preciso descer.
__ Aqui não pode, senhor.
__ Mas eu vou ficar atrasado, eu não posso me atrasar, eu quero descer.
__ Aqui não pode, senhor. Estamos na cabeceira da pista. O comandante sabe o que faz. Se não der para decolar, ele vai voltar e o senhor desce, OK? Mas não deve ser nada não. Daqui a pouco estamos voando.
O Nonô olhava pela janela do avião, depois para as luzes de advertência, e olhava de novo, as mãos suadas, foi quando avisaram que estava tudo legal e lá se foi a potente aeronave levando o nosso baterista para Porto Alegre.

Desligados os motores, ele foi um dos primeiros a descer. Sabe aqueles caras que não sabem esperar, vão empurrando uns e outros na ânsia de sair? Pois é. Ao avistar a morena apaixonada, foi logo perguntando:
__ Cê tá de carro aí? Cê tá de carro aí?
__ Coloquei no estacionamento.
__ Vamos lá, vamos lá.
A coitada seguia arrastada pelo braço, sem entender a razão de tanta pressa.
Entraram no carro, machão ao volante e um nervosismo que não tinha nada de musical.
__ Onde é que tem um motel aqui?
Intimidada daquela forma, a pobre moça quase não conseguiu balbuciar uma resposta.
__ Eu não sei. Eu sou casada. Eu moro em Caxias do Sul.

Foi assim que o Nonô pegou a primeira estrada que viu pela frente e foi parando, de posto em posto de gasolina, perguntando bem alto:
__ Ô cara, aonde é que tem um motel por aqui, hein?
__ Faz o seguinte, anda mais uns cinco quilômetros que tem um retorno. Aí o senhor faz a volta, porque é do outro lado. É pertinho. Chama Motel My Love.

Uma acelerada mais rápida, uma tensão a mais para não errar o retorno e a mocinha, coitada, nem olhava direito o rosto do motorista que tanto sonhara. O My Love não tinha nem uma estrela. Era uma tragédia, a começar pelo cheiro de mofo. E o Nonô olhando no relógio todo o tempo, com medo de se atrasar para o show da noite. Foi tirando a roupa bem depressa, ela no canto desabotoando timidamente a blusa e... quando ele baixou a cueca, ejaculação precoce! Já pensou? A coitadinha não ganhou nem um beijo na boca, ficou ali aturdida, olhando aquele baterista tão bonito, tão másculo, tão enganadoramente romântico.
__ Deu tudo errado hoje. S’imbora.

Quanto ao show, deu tudo certo.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

UM EMPREENDIMENTO PREMATURO

Sabe esses chips que agora vêm em quase todos os cartões de crédito? Pois é. Em 1994 recebi a ligação de um amigo meu que morava em Houston.
__ Marcelo, tem uma oportunidade de ouro pra nós. A empresa em que eu trabalho aqui em Houston está na bica de pegar a representação da Orga Card Systems, que faz o smart card.
__ Mas o que é isso?
__ Rapaz, é um chip que vai tomar conta do mundo. Em breve não teremos mais dinheiro, cartão de saúde, carteira de identidade, nada. Tudo vai ser com smart card, é como se fosse a memória de um computador.
__ E o que você quer que eu faça?
__ A Orga pertence ao Banco Central e à Casa da Moeda alemã. Você arranja aí no Brasil um cara que tenha algum dinheiro, não precisa muito, basta bancar as despesas de vendas...

Imagine: um cara me ligar dos Estados Unidos dizendo que tinha um produto futurístico nas mãos, etc. e tal. Embarquei na hora. Arranjei quem financiasse a operação, os alemães vieram assinar o contrato, trabalhei mais de um ano em busca das vendas milionárias.

Rio pra cá, São Paulo pra lá, muita solidão em São Paulo, noites mal dormidas, whisky em quantidade – pumba! A bipolaridade me colocou em euforia. Nada muito grave, não precisou de internação – apenas uns remedinhos de enrolar a língua para ficar mais equilibrado e voltar a tomar carbonato de lítio.

E um tempinho pra reflexão também. Estávamos em 1995 e o presidente mundial do Citibank declarou no jornal que em 2005 todos os cartões de crédito teriam smart card. Dez anos. Quem é que pode esperar dez anos pra fazer a feira? Espírito empreendedor tem disso: às vezes a gente abraça uma idéia que está muito adiante do tempo e haja dinheiro para esperar resultados!

terça-feira, 22 de junho de 2010

BIPOLARIDADE INFLUI NA PERSONALIDADE

As pessoas que têm transtorno bipolar podem estar perfeitamente equilibradas se tiverem um acompanhamento médico competente e, em muitos casos, psicoterapia. Entretanto, mesmo nos períodos estáveis a bipolaridade influi na personalidade. Mas pode ser para o bem. Características comuns aos bipolares, como é o caso da criatividade, do espírito empreendedor e da autoconfiança podem nortear muitas decisões de vida. Algumas mais ousadas ou arriscadas, porém exitosas. Veja em
http://www.youtube.com/watch?v=140KREvZf88

segunda-feira, 21 de junho de 2010

UM POUCO MAIS SOBRE CRIATIVIDADE

Jamais vou me esquecer de um funcionário do Serviço de Direitos Autorais, quando estive lá para registrar uma idéia de um novo jogo, que chamei de “Loteca dos Campeões”. Ele analisou o pedido e disse:
__ A gente não registra este tipo de coisas, a gente não registra idéias promocionais, esquemas de jogos ou negócios.
__ E por que?
__ O conhecimento pertence à humanidade, meu caro. Quando você obtém um direito autoral, um registro de marca ou de patente, passa a ser monopolista daquela originalidade. A lei não lhe permite certos monopólios.

Ainda soa meio vago para mim. Uma canção pode. Um novo jogo não pode. Mas que o conhecimento pertence à humanidade, disso não tenho dúvidas. Fiquei pensando o seguinte: o sujeito é criado dentro de uma redoma, sem contato humano, sem ver nem ouvir nada lá de fora. Quando ele crescer, vai ter condições de criar alguma coisa? Só se relacionar a alimentação que deram a ele ao funcionamento do seu próprio corpo, algo assim. Criar é o ato de relacionar conhecimentos adquiridos, na escola ou na vida, e arranjá-los de forma original. É uma busca pelo novo, mas criações originais partem do conhecimento de si próprio e daquele que a humanidade nos proporciona:
“Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava um rock
Para as matinês...”

A criatividade também exige elaboração, transpiração. Por mais criativo que seja o Chico Buarque, ele precisa se dedicar, estudar, trabalhar, perseverar. Só depois passa a ser genial. Até mesmo os bons repentistas, supostamente sem escola, são exímios observadores do seu mundo. Para citar um exemplo de outra área, Bobby Fischer começou a jogar xadrez com 6 anos de idade, foi campeão americano aos 13, mas só ganhou o campeonato mundial aos 29. Genialidade exige esforço.

Com os bipolares é a mesma coisa. Ser criativo apenas não é suficiente. Muito menos em estado de humor eufórico.

domingo, 20 de junho de 2010

BIPOLAR É MAIS CRIATIVO QUE OS OUTROS?

Coisa nenhuma! Quer ver? Oscar Niemeyer, Chico Buarque de Holanda, Carlos Drummond de Andrade, Machado de Assis – pode aumentar essa lista à vontade. Nenhum deles sofre ou sofreu de transtorno bipolar. Todos são geniais.

Outros sofreram e não se trataram adequadamente. Também eram geniais, mas tiveram fins trágicos, ou se entregaram ao alcoolismo e outras drogas: Elvis Presley, Hemingway, Cazuza, Elizabeth Taylor – a lista também é extensa.

O certo é que nós, bipolares, podemos ser sensíveis e criativos, podemos ser entusiasmados, empreendedores, generosos e carismáticos. Possivelmente somos, e muitas outras pessoas também são. Mas outro dia eu assisti um documentário na TV, focando vários artistas bipolares de Hollywood. Muitos rejeitam a medicação porque têm medo de perder a criatividade. Estão completamente enganados. Vivem de sucessivas crises. E, se fossem estáveis, certamente produziriam mais e melhor.

sábado, 19 de junho de 2010

ENXAQUECA E IRRITAÇÃO

A enxaqueca, entre inúmeras outras causas, pode ser proveniente de oscilações de humor e ansiedade. Por isso, pode ser que os bipolares sofram de enxaqueca. Eu já tive dores terríveis, que me atacavam no fundo do olho direito. Tudo começou quando eu tinha uns 17 anos, mais ou menos. Na época, nenhum médico acertou. Um Dr. Fulano teve o desplante de me receitar colírio Mirus, sendo que eu não tinha nenhum problema na vista. Tipo assim: na falta de conhecimento, toma aí um placebo, quem sabe?

Em certos momentos da vida, o bipolar também pode ser bastante irritadiço, até mesmo violento. Hoje em dia, quando perco o controle, uso de violência verbal. Mas é raro. Entretanto, o nervosismo é um sinal importante para que a minha mulher me dê o sinal amarelo.
__ Marcelo, você anda muito nervoso com esse novo trabalho. Procura o médico.
Muitas crises podem ser evitadas quando alguém da família ajuda no diagnóstico. E ouvir é uma atitude Inteligente.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE ESPINHOS

Você já ficou vários dias deprimido, entrou num elevador e foi se encolhendo, se agachando no canto a cada pessoa que entrava? Você já ficou eufórico a ponto de entrar numa livraria e comprar R$6.000,00 em livros, depois passar a noite inteira rindo sem parar? Você já concluiu que o feixe de luz que entrava pela sua persiana tinha algo de divino, tinha um santo que vinha conversar com você?

Tudo isso já aconteceu comigo. Aconteceu antes que eu tomasse o lítio, porque os medicamentos não eram os mais adequados, ou aconteceu depois, porque negligenciei o tratamento ou então o sono. Perdi o equilíbrio, pura e simplesmente.

Pesquisando na internet, encontrei um sujeito dizendo que era bom mesmo não tomar os remédios direito, porque se todos tomassem viveriam chapados e não teríamos chance de ler a genialidade de Hemingway.

A bipolaridade do escritor (psicose maníaco depressiva naquela época) foi diagnosticada nos seus últimos anos de vida. Ele tinha outros problemas graves de saúde, inclusive o alcoolismo. Seu transtorno foi tratado com eletrochoque, com algum sucesso, mas logo depois ele começou a perder a memória e se suicidou.

Você acha que Hemingway era feliz? Você acha que os episódios de euforia que relatei da minha vida têm alguma coisa próxima da genialidade? Você acha que para produzir uma obra genial o sujeito tem que ser bipolar, louco ou desajustado? Claro que não.
Os remédios não nos deixam necessariamente chapados, muito menos reduzem a nossa criatividade. O que eles nos dão é estabilidade de humor, o que ajuda muito para trabalhar bem, conviver bem, criar coisas boas e buscar a felicidade.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

POR QUE EU NÃO GOSTO DA SELEÇÃO DO DUNGA

Um time bipolar tem vocação e talento para o ataque. A frase não é minha, é do Dr. Diogo Lara. Para o bem ou para o mal, a bipolaridade envolve ousadia. Você acha que o time do Dunga é ousado? Para o sucesso ou insucesso, o bipolar é criativo, entusiasmado e enérgico. Você acha que o Gilberto Silva e o Felipe Melo têm essas características?

O bipolar também costuma ter pensamento rápido, visão, muito otimismo e auto confiança. Não quero dizer que todas as pessoas com essas qualidades são bipolares. Não me consta, por exemplo, que o Ganso, o Neymar e o Ronaldinho Gaúcho tenham qualquer transtorno, mas que eles criam sérios transtornos para as defesas adversárias, isso eles criam. Talvez o Dunga seja o único brasileiro que não concorda com o talento desses jogadores. É por isso que a Seleção é dele, só é nossa pelo uniforme.

terça-feira, 15 de junho de 2010

MAIS UM PAINEL NA MINHA VIDA

Dessa vez foi no Vidigal.
O cabo eleitoral chegou pra mim e falou, com o maior entusiasmo:
__ O senhor precisa ir lá, lá no alto. Tem uma vista pra comunidade inteira. Mas tem que ser um painel bem grande, com a fotografia do deputado, todo mundo vai ver!

No dia seguinte eu subi o morro com o Moreira a tiracolo. É interessante. Você sobe a favela do Vidigal do início ao fim por via asfaltada. Às vezes fica estreitinho, faz curvas feito um caracol, mas você chega lá no alto. No cocuruto do morro tem uma praça, tem um bar com sinuca e uns caras que te olham com vistas de poucos amigos. Como não podia deixar de ser, um bebum foi se chegando.
__ É o painel? O senhor veio ver o painel. É ali naquela lage, oh!
Nessas horas, nada de duvidar da sapiência do álcool.
__ Vamos medir, Moreira.
__ Marcelo, isso aqui vai precisar de uma super estrutura. Olha o tamanho desse negócio, olha o vento!
__ ‘Cê me entrega quando?
__ 7 dias, no mínimo.
__ ‘Cê ta louco, cara? Uma semana chega em cima da eleição! Três dias no máximo, vai!

Pagamos o dono da lage adiantado, o Moreira levou os ajudantes e começou a trabalhar. Mas não sem antes me ligar pra dizer que não dava pra puxar a força, patati-patatá. Essas coisas que a gente acaba resolvendo.
Não demorou muito, mais uma vez o maldito celular:
__ Marcelo, ta caindo solda na lage de baixo e o cara já veio aqui dar a maior bronca. Ta rolando o maior churrasco lá embaixo. Terça feira, é mole?
__ Joguei merda na cruz, só pode ser. Vai fazendo o que der com a estrutura deitada. O Arnaldo já ta silkando a lona, amanhã de manhã vai pra aí.

No dia seguinte, equipe toda na maior força-tarefa, celular de novo.
__ Marcelo, os caras vão invadir a Rocinha, isso aqui virou a maior praça de guerra. Ta todo mundo com medo, a gente vai embora.
__ Vai embora não, peraí.
E lá fui eu subir aquele caminho tortuoso. Quando cheguei lá em cima, já estava escurecendo e a praça apinhada de gente, cada cidadão de botar medo nos irmãos Metralha. Tinha até bazuca, é mole? E de repente, pum!!! Os caras estouraram o transformador da Light com um tiro de fuzil, de escopeta, sei lá. O certo é que ninguém queria luz por aquelas bandas.

Não preciso dizer que saímos bem de fininho, e que o deputado ficou sem o seu painel, certo?

segunda-feira, 14 de junho de 2010

REPORTAGEM SOBRE BIPOLARIDADE EM PORTO ALEGRE

http://bit.ly/aAMJsE

domingo, 13 de junho de 2010

MINHA PRIMEIRA CAMPANHA POLÍTICA

Você não sabe o que é um candidato na reta final de uma eleição. Principalmente se for para vereador ou deputado estadual. Tem um caminhão de candidatos, nenhuma pesquisa é confiável, tudo que se sabe sobre quem vai ganhar é exercício de ficção. Aí o candidato, por melhor que esteja fazendo a sua campanha, entra em pânico. Começa a enxergar a derrota como se fosse uma assombração.

E haja adrenalina pra cima da equipe. É cada grito de assustar lobisomem! Todo mundo fica com os nervos à flor da pele, e o bipolar lá, cargo de chefia, tendo que fazer acontecer e aparando aquela gritaria toda.

__ Marcelo! Vai correndo lá na Rocinha, procura o Fulano que ele vai dar um espaço em cima de um prédio pra gente colocar uma lona. Faz essa instalação até amanhã, que a gente não pode perder um minuto!
__ Tomou seu carbonato de lítio direitinho hoje, Marcelo? Tegretol também? Então, mãos à obra. Primeiro ligo pro Moreira, que ele já vai junto pra medir o local e providenciar a estrutura de ferro. Depois ligo pro Arnaldo, do silk-screen, já com as medidas na mão. Vamos lá, vamos encarar esse Fulano de Tal.
__ Olá, senhor Marcelo. É um prazer conhecer o senhor, que trabalha para um candidato que eu tenho o maior respeito. Vamos lá em cima, na laje, que eu vou mostrar a visão mais espetacular para a sua campanha.
__ De fato, é um espetáculo! Moreira, mede ali, por favor. E olha, eu quero esse painel muito bem iluminado, hein! Aqui é passagem. A comunidade toda vai ver.

Até então estava convencionado que era tudo na camaradagem.
__ Olha, seu Fulano. Quando acabar a campanha deixo aí a armação de ferro e a iluminação, para o senhor anunciar o que quiser.

Uma semana depois, tocou meu celular. O Fulano do outro lado.
__ Sabe, senhor Marcelo, eu tenho um sócio. E ele não aceita ceder a laje de graça, o senhor entende...
Pensei comigo, se eu fosse levar esse problema pro candidato, já perto do dia das eleições, seria uma crise, uma gritaria, sei lá o que podia acontecer.
Liguei pro cara do silk screen. Ô Arnaldo, embute mil reais aí nesses serviços que você está fazendo pra mim e paga esse fdp desse Fulano de Tal.

Eu só não contava com a greve dos bancos. O Arnaldo só podia pagar com cheque, o Fulano queria dinheiro vivo, ficou uma ladainha de umas duas semanas no meu ouvido. Haja Rivotril na hora de dormir!

PSIQUIATRA OU TERAPEUTA?

Uma vez cheguei no consultório do Dr. Ulisses Vianna Filho, um psiquiatra clínico. Eu estava meio deprimido e comecei a desfilar uma porção de problemas da infância. Não é que o mestre dormiu? Quando eu falei mais alto, buscando a sua atenção, ele deu aquela cabeçada de quem precisa acordar e falou:
__ É preciso saber se você está doente por causa disso tudo, ou se está lembrando disso tudo porque está doente.
E me tratou quimicamente. Carbonato de lítio, a partir do momento em que outros remédios me tiraram da depressão. O lítio só era ministrado quando a gente readiquiria o equilíbrio e, então, cabia a ele manter a estabilidade.

Hoje em dia, é comum o tratamento químico conjugado com a terapia. O sujeito pode ter problemas familiares ou no trabalho, pode ter dificuldades de adaptação à vida social, a terapia pode ser uma poderosa ajuda para a tão almejada estabilidade.

Mas, no meu caso, sem a química não dava.

ÁLCOOL FAZ MAL OU BEM PARA BIPOLARES?

Palavra de um psiquiatra: o álcool é uma droga social, compatível com quase todos os medicamentos que existem. Logicamente, há uma grande diferença entre tomar um chopp ou 3 doses de whisky. Mas a rigor, a rigor, álcool só não combina bem com remédios tarja preta - Rivotril, por exemplo. Pode provocar um sono irresistível.

No meu caso, quando vou a uma festa e tomo todas, se chegar em casa e colocar um Rivotril pra dentro, durmo na hora. Depois acordo no meio da noite, aceso. Difícil dormir de novo.

sábado, 12 de junho de 2010

ELVIS PRESLEY TOMAVA OS REMÉDIOS ERRADOS

Alguns perguntam por que alguns bipolares famosos tiveram vidas tão trágicas. Elvis Presley, por exemplo, foi um dos maiores ícones da música popular em todo o mundo, o primeiro artista a realizar um show via satélite, com audiência de 1,5 bilhão de espectadores. Teve uma vida altamente conturbada, com grandes variações de humor, ficou viciado em remédios e morreu provavelmente de um colapso cardíaco em sua mansão, em Memphis. Isto aconteceu em 1977. Até aquela época, os tratamentos para bipolaridade com medicamentos estabilizadores de humor não eram comuns. Pelo menos não eram tão bem conhecidos como hoje.

Curiosamente, 1977 foi quando eu cheguei ao Rio, diagnosticado como psicótico maníaco depressivo, que era o maldito nome da época. De cara, o Dr. Ulisses Vianna Filho substituiu todos os meus remédios por Carbonato de Lítio. Fiquei muito bem estabilizado e pude retomar o ritmo da minha vida normalmente. Só tive novos problemas quando achei que não precisava mais do remédio ou quando negligenciei o sono. Bipolar é muito agitado, precisa dormir bem.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

PROMOVENDO O LIVRO E SE CONHECENDO MELHOR

Eu fui a Porto Alegre a convite do Shopping de Belas e da Saraiva Mega Store. Participei de uma reportagem da TV RBS (http://bit.ly/aAMJsE), fui entrevistado na Rádio Gaúcha e na TV Com, também da RBS, mais tarde participei de um debate com o jornalista Tulio Milman e o psiquiatra Diogo Lara, que é autor do livro Temperamento Forte e Bipolaridade, Editora Saraiva. Fotos em http://www.saraivaconteudo.com.br/Blog.aspx?filtro=3

A conversa foi muito enriquecedora, pois o Dr. Diogo Lara confirmou as impressões que eu tinha sobre a influência da bipolaridade na minha personalidade, mesmo estando perfeitamente controlado pela medicação própria.
O livro dele é excelente e eu recomendo para todos que são, ou pensam que são bipolares. E se você é um de nós, faça o tratamento adequado, com acompanhamento de um médico competente, depois tire proveito das características positivas do seu temperamento, que são mais ou menos comuns:
- o bipolar costuma ser muito ativo, quer explorar a vida e o novo, é festivo e afetivo;
- o bipolar anseia por liberdade, não se adapta bem a regimes de comandos rígidos ou por demais burocráticos;
- o estilo bipolar pode se manifestar naqueles que praticam esportes radicais, ou nos que se dedicam a trabalhos criativos. Pode também gerar modos de vida alternativos: hippies, religiosos, ativistas;
- os bipolares também se adaptam muito bem às necessidades de chefia e liderança ou a profissões liberais. Podem ser muito carismáticos;
- os bipolares que têm temperamento ciclotímico (têm bastante oscilação de humor, mas não chegam aos extremos da euforia ou da depressão) têm grande sensibilidade e lirismo. Muitos são escritores ou se dedicam a outras expressões artísticas;
- os bipolares leves têm vocação para se envolver em várias atividades ao mesmo tempo. Usam bastante a intuição, além da razão, e costumam dar conta do recado.

Remédio todo dia, talvez uma terapia para ajudar – fica tudo lindo. Mas, quando não se leva adiante o tratamento, não é bom nem lembrar das características prejudiciais do temperamento de um bipolar...

sábado, 5 de junho de 2010

Este blog surgiu do livro do mesmo nome, editado pela Record. A intenção é discutir a bipolaridade com os leitores, mostrar que é possível conviver muito bem com ela, desmistificar o problema, desfazer preconceitos.

Mas é preciso que se entenda que eu não sou médico. Sou apenas um bipolar que tem uma experiência de vida para dividir. Quando surgir por aqui alguma questão que eu não saiba responder, vou procurar um psiquiatra ou terapeuta que possa me ajudar.

Olha, se você é um de nós, saiba que já recebeu uma grande benesse, pelo menos na terminologia. Antigamente eu era psicótico maníaco depressivo. Já pensou? Sou PMD, quero casar com a sua filha. Sou PMD, me dá um empreguinho aí? De uns tempos para cá passaram a dizer que eu tenho um transtorno bipolar. Nem doença é, só um transtorno, e que transtorno!

Mas já fica mais fácil ser aceito. Também é bom que se saiba que inúmeras personalidades muito bem sucedidas em suas profissões são ou foram bipolares: Francis Ford Coppola, Tim Burton, Elizabeth Taylor, Jim Carrey, Tom Waits, Robin Williams, Axl Rose, Salvador Dali, Marilyn Monroe, Elvis Presley. E mais: Mark Twain, Theodore Roosevelt, Winston Churchill, Rosemary Clooney, Sylvia Plath, Isaac Newton, Carrie Fisher, Jean Claude Van Dam, Beethoven, Ernest Hemingway, DMX, Patty Duke, Ralph Waldo Emerson, Peter Gabriel, Cherri Oteri. Quer mais?

Só não sei se são ou se foram felizes. Mas tenho certeza de que é possível ser.


FRANCIS FORD COPPOLA É BIPOLAR




Olha a cara dele aí. Talentoso pacas. Ítalo-americano, nasceu em Detroit em 1939, filho de gente das artes. Pouca gente sabe, também é tio do Nicolas Cage.

Nosso herói começou a vida sofrendo uma poliomielite, logo aos dez anos, o que não o impediu de se tornar um dos maiores nomes do cinema. Aos 31 anos já tinha escrito Patton e seu famoso discurso inicial às tropas americanas:
__ “Agora eu quero que vocês se lembrem que nenhum bastardo jamais ganhou uma Guerra morrendo por seu país. Ele ganhou a guerra fazendo o outro pobre bastardo morrer pelo seu país.”

Seu maior feito foi roteirizar e dirigir O Poderoso Chefão (parte I e II), todos dois ganhadores do Oscar de melhor filme. Coppola foi indicado 14 vezes ao Oscar e 5 vezes à Palma de Ouro em Cannes. Antes disso, fez até filmes pornográficos. E depois fez Apocalypse Now, que por pouco não lhe levou à falência.

Bipolar tem essas coisas, às vezes um determinado projeto lhe leva à mais completa obsessão, ele investe mais do que deveria e depois se encrenca com as realidades que não vislumbrou e com as contas. Apocalypse Now custou US$31 milhões, foi filmado em 4 anos, sendo 18 meses na selva, já pensou? Não preciso dizer que as dívidas decorrentes levaram Coppola a trabalhar para terceiros. Mas nos anos 90, depois de alguns filmes muito criticados quanto à concepção e qualidade, ele deu a volta por cima, fez O Poderoso Chefão 3 e faturou US$82 milhões com Drácula em poucas semanas.

Sua vida não se restringe ao cinema. Já se dedicou ao ramo de restaurantes e a uma vinícola no vale do Napa, na Califórnia. Ao mesmo tempo, foi visto em Buenos Aires, em 2009, selecionando atores para um novo filme, o que demonstra um dinamismo acentuado. É o que eu digo sempre: a bipolaridade nos leva a uma grande ansiedade por criar ou fazer coisas novas.

O transtorno de Coppola aparece em um making of de Apocalypse Now. Sua mulher escreveu: "Eu acho que ele teve uma espécie de crise nervosa." O próprio Coppola notou que pouco a pouco foi ficando doido, numa referência às dificuldades da filmagem. Biógrafos se referiram à carreira de Francis Coppola como um surgir e ressurgir. Criações brilhantes e de baixa categoria se alternaram, embora as brilhantes prevalecessem.

E quando perguntaram a ele qual o atributo mais importante de um cineasta, a resposta foi simples: "Coragem. Coragem quanto a seus instintos e suas idéias, porque senão você simplesmente se submete e muda. E as coisas que podem se tornar memoráveis estarão perdidas.”