sábado, 31 de julho de 2010

TURRÃO OU PERSEVERANTE?

Pode ser também senso de justiça. Quem julga é você.

Certa vez entrei numa agência do Unibanco, que se dizia 30 horas mas, definitivamente, não dispunha de segurança para prestar os serviços que anunciava. Era sábado à tarde, nenhum funcionário presente, a máquina do Banco "roubou" meu cartão e o telefone estava quebrado. Resultado: houve uma fraude de R$6.200,00 na minha conta, o Banco não assumiu o prejuízo, cortou meu cheque especial, me fez assinar uma confissão de dívida para não levar meu nome ao Serasa, depois levou, fiquei sem crédito, sem cheque, sem nada.

Estou contando assim depressa porque me ensinaram que os textos devem ser pequenos na internet. Mas essa brincadeira durou anos e, de apelação em apelação, os advogados do Banco foram atrasando o meu. Certo dia surgiu a possibilidade de um acordo. Fui lá. O cara fez uma proposta indecente, confiando que eu não ia aguentar a espera. Respondi seco e grosso:
__ Daqui a 10 anos ainda estarei vivo.

Não chegou a tanto. Nove anos e alguns meses depois recebi na justiça por volta de 125 mil reais. Cobrando juros dos seus clientes nos cheques especiais, o Banco possivelmente ganhou até mais, em cima do meu dinheiro perdido inicialmente. Mas, para mim, foi uma vitória. Pelo valor que recebi e pelo gostinho de saber que aquele gigante me assinou um cheque.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

UBUNTU

Eu aprendi esta palavra num filme muito bonito sobre a África do Sul. Ubuntu traz o conceito de que "eu sou quem eu sou por causa de quem todos nós somos". Mandela ensinava mais: fazemos parte um do outro; quando alguém fere a mim, fere também você, fere todos neste mundo e também ele próprio; nós não estamos sozinhos neste mundo.

Foi com esses princípios na mente e no coração que os negros perdoaram os horrores que sofreram dos "africaners": "fale-me porque fez isto para eu poder perdoá-lo", eles pediam. A verdade libertava e os criminosos eram absolvidos.

Será que essa palavra - Ubuntu - tem a ver com a cultura brasileira? Vamos pensar naqueles que foram roubados no útero. Roubaram o esparadrapo do hospital, os remédios, as vitaminas do pré-natal; depois roubaram a merenda escolar, pagaram aos pais deles salários que não davam para os cadernos, muito menos para os livros. E quando eles cairam no mundo, ouviram bem alto: "aprendam a pescar", mas nem ao menos lhes disseram onde ficava o rio.

E essa legião de roubados no útero conseguiu produzir muitos cidadãos que, pasmem todos, não são criminosos. Lutam pela vida, querem dar aos filhos o que não tiveram e abaixam a cabeça quando são discriminados, em concordância: "eu perdoo os que me roubaram porque é assim mesmo - eles receberam ordens do seu ambiente cultural". O perdão liberta e os injustiçados seguem em paz...

quinta-feira, 29 de julho de 2010

SOMOS TRIPOLARES?

Uma leitora escreveu reclamando que o meu livro tinha pouca coisa de bipolar, eram mais crônicas de um publicitário. Imagino que, no entendimento de muita gente, o bipolar ou está deprimido ou está eufórico, e só isso interessa saber.

Engano. Raciocine comigo: se um sujeito é míope, ele coloca os óculos apropriados e passa a enxergar muito bem, certo? Mas ele não deixa de ser míope. Conosco é a mesma coisa: fazemos o tratamento mais adequado e o nosso comportamento passa a ser normal. Mas não deixamos de ser bipolares, com vários traços bem marcantes de personalidade.

Então, poderíamos dizer, como leigos, que somos tripolares: deprimidos, eufóricos ou estáveis. Quando estáveis produzimos muito bem, vivemos normalmente em sociedade, em família ou no trabalho. É isso que o livro mostra. Todas as crônicas são de um bipolar. Ou tripolar, como queiram.

OBS: a leitora também disse que eu estava usando de uma doença incurável para ganhar dinheiro. Em primeiro lugar, não é uma doença, é um transtorno de humor. Em segundo lugar, não vivo de vender livros e este blog pode ser lido por todos, sem qualquer pagamento.

terça-feira, 27 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (11)

__ Após todos esses anos convivendo com o transtorno bipolar, o que você aprendeu?

Aprendi a controlar algumas características ruins da minha personalidade. Por exemplo: achar que eu era muito inteligente, que sabia mais que os outros, que deveria fazer valer os meus pontos de vista. Acho que melhorei muito nesse ponto, mas ainda há muito que melhorar. O principal é saber ouvir, buscar compreender a razão dos outros. Quando a gente percebe que as nossas idéias não são únicas, muito menos as melhores, passa a conviver muito mais facilmente. E a compreensão também inibe uma certa propensão para a violência, mesmo que verbal.

Outro fator importante é o ilusionismo. Apesar de controlado pelos medicamentos, eu posso ser propenso a me iludir com as próprias idéias, ou com as minhas possibilidades de sucesso futuro. Tanto pelo exercício mental, como pelas porradas da vida (estou com 62 anos), aprendi muito nesse aspecto. Estou bem mais racional.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

ESPIRITUALIDADE TAMBÉM AJUDA

Eu digo no meu livro que não sei rezar. Não consigo compreender a lógica das divindades, assim como nos explicam as religiões, portanto não consigo sentir Deus. Mas acho que tantos povos já experimentaram as mais diversas manifestações espirituais, que Ele deve existir mesmo. Não sei como, mas deve.

Também acredito que as religiões, enquanto puras, sejam benéficas para todos nós. Eu fui criado na religião católica e, por influência do filósofo Bertrand Russel, me tornei agnóstico ainda adolescente. Mas voltei a buscar apoio espiritual na fase adulta, principalmente em virtude de algumas crises financeiras. Dá um nó no estômago ir pra cama sem saber como ganhar o pão do dia seguinte.

Numa dessas buscas, veio a idéia: por que Jesus jamais é retratado sorrindo, você sabe? Ou Ele está sofrendo, ou com a fisionomia grave, ou plácido. Em raríssimas vezes, um desenho sugere um ligeiro sorriso. E como deveria ser o mundo para que Jesus abrisse o seu sorriso? Como nós deveríamos agir para que Ele sorrisse largamente. Pensando nisso, eu e os amigos de sempre - Luiz Aguiar, Azambuja e Tavito - criamos um projeto chamado O Sorriso de Jesus. Previmos episódios de TV, histórias em quadrinhos, CDs e um monte de produtos. Mas tudo deveria começar com uma missa, musicada do início ao fim, bem alegre, como nunca se fez.

A idéia andava bem em certos setores da PUC-RJ. O pároco e teólogo de lá estava entusiasmadíssimo (para quem ainda não sabe, essa palavra significa "com Deus dentro de si"). Mas como me disseram depois, "esbarramos nos capuchinhos". Por que será que eles não querem sorrir durante as suas orações?

Se as missas fossem mais alegres, tivessem mais apelo para o nosso tempo, talvez eu voltasse. E talvez sentisse.

domingo, 25 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (10)

__ Como é o seu processo criativo e de que maneira a bipolaridade influencia nele?

A transpiração é a maior parte, e isso não é só para bipolares, Estudo, pesquisa, raciocínio lógico - sem conhecimento e trabalho não há como desenvolver bem as criações. A bipolaridade é apenas uma inquietação criativa, no meu caso. Eu quero o novo, sempre. E vou relacionando conhecimentos para buscar a originalidade. Quando acredito na idéia, aceito correr riscos. É aquela característica do bipolar ousado.

Vejamos o caso do cometa Halley, que toma boa parte do meu livro. O processo ocorreu assim:
1. fiquei sabendo que o cometa ia passar, ia inspirar músicas e souvenirs.
2. na época, eu estava trabalhando na Hollywood Sport Line. Uma marca de cigarros estava se diversificando em vestuário e artigos promocionais para venda.
3. relacionei as duas informações: o nome do cometa poderia servir para inúmeros produtos.
4. transpirei: era preciso criar personagens inspirados nele, para que os produtos não morressem logo após o evento.
5. transpirei de novo: fiz o plano de marketing, previ das histórias em quadrinhos às camisetas; dos chicletes às jóias da H, Stern.
6. busquei apoio: Luiz Antonio Aguiar desenvolveu todas as histórias em quadrinhos e para TV; Lielzo Azambuja criou os desenhos, fez toda a direção de arte; Aécio Flavio fez a música; Luiz Felipe Tavares entrou de sócio, trabalhou duro na comercialização e financiou.

O processo criativo foi contínuo, durante alguns anos. E não foi só meu. Só faltou combinar com o cometa, que prometeu cobrir dois terços do céu e apareceu fraquinho, fraquinho.

sábado, 24 de julho de 2010

Duendes da lua

O bipolar que vos fala passa em frente a uma loja de presentes totalmente transformada para a venda do chamado “New Age”: livros, incensos, artigos indianos supostamente espirituais e duendes. Uma profusão de duendes. O bipolar pensa: esse negócio de duendes deve dar uma nota! Olha a quantidade! Olha como vende!

No dia seguinte, senta-se à frente do computador:

__ Eu tenho que entrar nessa onda. Alguma coisa eu tenho que criar. Já sei: vou criar um grupo de duendes que seja só meu. Desenho original, temática original. Quero 7 duendes, que é um número meio mágico, e cada um vai representar um grupo de virtudes. Histórias para crianças, bem leves, com perigos e personagens do mau, mas não tão maus assim.

Passo seguinte: chamar a turma que desenvolveu os personagens Halley: Luiz Antonio nos textos, Azambuja nas ilustrações. E fazer o copyright para garantir a propriedade, óbvio. Tempos mais tarde o Tavito emprestou duas músicas que caíram como luvas para a nossa temática: Felicidade Já e Fábrica de Chocolate.

Como já ocorreu outras vezes na minha vida, consegui o interesse de duas empresas americanas. Uma delas foi o Cartoon Network. Mas eles queriam mais desenvolvimento, animação, todas essas coisas que a gente não tinha dinheiro para fazer no Brasil. Na avaliação da executiva de lá, os personagens são “cute”. Você acha? Veja em http://www.conscius.com.br/images/duendes_da_lua.pdf . Se eu pudesse, produziria os desenhos animados a meu próprio risco. Livros infantis também.


sexta-feira, 23 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (9)

__ Em sua carreira de publicitário, você desenvolveu diversos projetos ousados. Você acredita que a bipolaridade tenha influenciado essas ações?

Meu psiquiatra atual, Dr. Elcio Carneiro Carvalho Jr., afirma que a bipolaridade influencia a personalidade. De forma simplista, na minha vida as coisas ocorreram mais ou menos assim:
a)- em depressão, jamais criei coisa alguma;
b)- em euforia, jamais criei nada que fosse aproveitável. A euforia nos dá ilusões de genialidade, mas quando passa a gente se dá conta de que as nossas criações não têm lógica.
c)- por sorte, a gente fica em transtorno durante curtos períodos de tempo em relação à vida toda. Eu já estou sem uma crise há mais de 15 anos. Então, nos períodos controlados existem certas características comuns a muitos bipolares que podem ser bastante positivas: busca por coisas novas, espírito empreendedor, ousadia, carisma etc. Foram traços de personalidade como esses que me impulsionaram a planejar e executar o marketing do cometa Halley, na década de 80: lançamos mais de 200 produtos, através de 53 empresas que aderiram ao projeto. Recentemente, lancei na internet uma campanha contra a corrupção: voteperereca.com.br . E outras novidades virão...

quinta-feira, 22 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (8)

__ Que fatores contribuem para a eclosão de uma crise?

No meu caso, negligência em administrar os medicamentos, ou a falta de sono durante algumas noites por excesso de trabalho ou de festas, tanto faz. É importante notar que a cabeça de um bipolar já é inquieta por natureza. Se os fatores externos também são agitadíssimos e se quem tem o transtorno não descansa, a crise pode aparecer a qualquer momento. Sabendo disso, não entro em crise há muitos anos.

Mas vamos reparar que as pessoas reagem de forma diferente. Tem bipolar que dorme 4 horas por noite e não sente falta de mais sono. Por outro lado, situações de grande estresse ou perdas emocionais sérias podem desencadear uma crise. Conheci uma moça que, em curto espaço de tempo, perdeu os pais, a madrinha e separou do marido. É muito. A primeira crise de bipolaridade dela veio daí. Foi uma depressão misturada com euforia e ela teve que ser internada.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A ESTRELA, O GORDO E O NEGRINHO

Esta crônica é politicamente incorreta mas, infelizmente, reflete uma realidade quanto aos nossos preconceitos. E me ensinou muita coisa.

Era uma ponte aérea São Paulo-Rio, a cantora tinha um lugar marcado lá no fundo do avião. Não estava nem um pouco satisfeita, viu alguns lugares vagos e pediu para trocar. Ao que um comissário tipo estagiário se prontificou.
__ Os assentos estão livres minha senhora, pode escolher o que quiser.
Estavam nada. Ainda havia passageiros entrando.
A estrela abundou-se no corredor da primeira fila e, logo depois, chegou o dono do assento: um gordo, muito gordo. Que me perdoe, mas a gente olhava pra ele e tinha aquela sensação de desleixo e que, de alguma forma, onde quer que ele ficasse ia incomodar alguém. Quando viu o seu lugar ocupado, murmurou um aborrecimento para o pessoal da companhia e voltou. Também, pudera. Tinha reservado aquele lugar com antecedência porque ali teria mais espaço. Daí a pouco veio outro funcionário e se dirigiu para a celebridade:
__ A senhora não pode ficar aí, o lugar está marcado.
__ Mas aquele outro garoto disse que o assento era livre, eu não quero ficar naquele lugar lá no fundo.
__ Sinto muito, mas a senhora não tem o direito.
__ Olha como você fala comigo, hein rapaz!
O gordo estava voltando, sacou o problema e disse para o comissário.
__ Você me arranja só um corredor, só isso.
Foi quando um negrinho com jeito humilde pulou para a fila do meio e cedeu o corredor para o gordo, que se encaixou na cadeira com esforço, suando, e deixou uma parte das banhas para cima do garoto. Mas o gordo tinha fairplay. Com a maior dificuldade do mundo, sacou um caderno de dentro de uma mochila que estava a seus pés e pediu um autógrafo pra cantora. Ela deu, mas nada de desculpas. Quando chegamos ao Rio, a comissária sorteou um bom pen-drive entre os passageiros. Coisa útil. Eu gostaria de ganhar. Pois não é que o gordo foi sorteado? Ato contínuo, deu o pen-drive para o bom negrinho:
__ O assento sorteado foi o seu!

domingo, 18 de julho de 2010

O DESTINO DA INGLATERRA NAS MÃOS DE UM BIPOLAR

Imagine uma das nações mais importantes do mundo sofrendo um ataque extraordinário da Alemanha na Segunda Guerra Mundial. Imagine um líder extremamente corajoso, carismático, competente, capaz de liderar até a vitória um país que tinha tudo para capitular. Este homem fora de série era Winston Churchill, que soube canalizar as suas características de bipolar, as boas e as ruins, para exercer sua liderança e realizar o que em muitas horas parecia impossível.

Os especialistas descrevem assim o temperamento bipolar de Winston Churchill:
- ele era combativo, até mesmo em suas relações pessoais. E parecia gostar da ocupação da guerra.
- sua percepção de grandiosidade o levava a desdenhar outras pessoas e outras opiniões.
- tinha constantes problemas financeiros, dado ao seu gosto pelo jogo e sua relutância em cuidar das próprias contas.
- era dotado de uma energia fantástica, trabalhando até 20 horas por dia.
- adorava escrever: deixou 15 toneladas de escritos pessoais. Não raro pronunciava discursos que duravam 4 horas ininterruptas. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, inclusive.
- sofria de depressões com freqüência, as quais chamava de Black Dog.
- era alcoólatra. Começava a beber whisky depois do café da manhã. Também era fumante inveterado (charutos) e adorava sobremesas. Com essas “compensações” ao paladar e ao espírito, ia levando em frente a sua bipolaridade, numa época em que os estabilizadores de humor que usamos hoje ainda não eram conhecidos.

Mais tarde, o Dr. Ronald Fieve, um dos pioneiros no tratamento com lítio nos Estados Unidos, classificou certos bipolares como IIB. São pessoas que usam a bipolaridade para beneficiar a si próprios, sua família e a sociedade. Como exemplos: Abraham Lincoln e Theodore Roosevelt.

sábado, 17 de julho de 2010

O PODER OCULTO DAS MULHERES

Para quem me segue diariamente neste blog, quero pedir desculpas pelos últimos dias de ausência. Estive em Belo Horizonte para lançar o meu livro, houve entrevistas na televisão, tudo foi muito corrido e não tive tempo de colocar aqui as minhas bipolaridades. Mas valeu, autografei mais de 100 livros por lá e participei de um talk show muito interessante com o psicanalista Sergio Matos e a jornalista Julia Andrade Pinto.

Lá pelas tantas, a Julia perguntou se eu já tinha feito psicanálise ou psicoterapia, que são muito indicados como coadjuvantes dos estabilizadores de humor que os bipolares devem tomar. Respondi que não, simplesmente porque os psiquiatras que me trataram não me indicaram isso.
O Dr. Sergio Matos atalhou:
__ Pelo que li no seu livro, no seu blog e no seu twitter, você mesmo se auto-analisou e, principalmente, a sua mulher. Ela sempre soube o que você precisava, ela funciona como um certo ponto de equilíbrio na sua vida.

A verdade é a seguinte: ela sempre mandou em mim sem que eu nem percebesse. O que me faz lembrar uma entrevista de um outro psicanalista, no programa da Marilia Gabriela, quando ele declarou que os homens são “progesterona orientados” porque nascem pela vagina. Para quem nasceu de parto normal, faz sentido. Talvez a gente viva obcecado por aqueles hormônios femininos, o que nos faz persegui-los e obedece-los, mesmo sem notar.

Aliás, “perseguida” não é um dos nomes dela?

quarta-feira, 14 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (7)

__ De que forma a família te ajudou e ajuda a enfrentar a doença?

É a minha esposa. Ela acompanhou todas as minhas crises, me conhece muito bem. Ao primeiro sinal de problema ela dá o alarme. E eu obedeço na hora. Segundo o Dr. Diogo Lara, com quem conversei em Porto Alegre, a família é fator importantíssimo para ajudar quem é bipolar. Mas nem sempre quem tem o transtorno quer ouvir. Obedecer à família quando surgem os primeiros sintomas é sinal de inteligência.

terça-feira, 13 de julho de 2010

DONA MARIA JOSÉ, QUE SAUDADE!

Era o primeiro dia de aula do primeiro ano clássico, no Colégio Estadual de Minas Gerais. Entramos na sala e já nos esperava uma professora mais que durona, que ia nos ensinar Português.

Primeiro dia de aula é dia de conversa fiada, né não? Eu sou assim, eu sou assada, a matéria do ano é essa, comprem tal livro etc. Coisa nenhuma! Dona Maria José de Queiroz só disse o seu nome e deu uma aula inteira sobre criação poética. No final, nos mandou criticar a obra de Cecília Meireles.
__ Tragam na próxima aula, valendo nota!
Ninguém tinha a mínima idéia de quem era a fulana e só podia acontecer o esperado:
__ Não achei nada, não senhora.
__ Fiz não senhora.
E ela só repetindo:
__ Cecilia Meireles escreve obras maravilhosas e alguém sabe alguma coisa para me dizer?
Eu gostava da última carteira, fila do meio, mas chegou a minha vez. Tinha feito uma visita à biblioteca pública e achado um único livro de autoria de Cecilia Meireles. Comecei gaguejando:
__ Sobre a-a obra, não a-achei não senhora. Mas achei um livro.
__ Que livro? O que o senhor encontrou?
__ Eu fiz aqui uma interpretação.
E fui lendo sem tirar os olhos do papel amassado...
Hoje em dia não me lembro mais qual foi o livro, mas vou tomar emprestados alguns versos que acho maravilhosos.
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzidas,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.

Ela gostou. E com a maior convicção do mundo, determinou:
__ O senhor vai ser um grande crítico literário.
Até hoje as palavras dela ecoam na minha cabeça. Assim como os meus pensamentos daquela hora:
__ Mas será que isso dá dinheiro?

segunda-feira, 12 de julho de 2010

QUEM NÃO FAZ LÊ NO JORNAL (OU NA VEJA)

Meu lema é o seguinte: se amanhã eu tiver uma boa idéia, ou o que parecer uma boa idéia, vou levar adiante e vou lutar por ela até prova em contrário. Inúmeras ocorrências em minha vida me autorizam a agir assim.

Vejamos uma delas: em 1980 eu li na revista Playboy que vinha aí um cometa chamado Halley, passaria em 1986 e sua cauda cobriria dois terços do céu. Fiquei encantado com a marca, corri para registrá-la no Brasil e nos Estados Unidos, juntei todas as minhas economias, pedi um dinheiro emprestado ao meu sogro e, dois anos depois, já tinha criado um grupo de personagens inspirados no cometa, tinha feito os registros mais importantes no INPI, enfim, tinha reunido o suficiente para interessar um sócio e investidor e continuar o negócio.

Foi quando, numa reunião na Rede Globo, para acertar detalhes do contrato que havíamos combinado sobre o evento, encontrei um amigo que me disse:
__ Eu tive essa idéia antes de você. Meu avô ficou maravilhado com o cometa quando era pequeno e não parava de me contar como foi. Eu procurei um advogado, mas ele disse que custaria muito trabalho e dinheiro, que não valia a pena registrar a marca. Depois, fiquei p da vida quando vi a sua reportagem na Veja: “Golpe de Mestre”, essa doeu no fígado.

Dores de cotovelo à parte, que é amigo, amigo é: na Novela Roque Santeiro, colocaram um cometa nas vestes do Beato Salu, o personagem Astromar procurava um cometa armado de uma grande luneta na praça principal da cidade e o Paulo Gracindo batizou um garoto com o nome Halley. Tudo arquitetado por ele.

PS: mas cuidado para não correr atrás de idéias que surgiram em período de euforia. Essas não são confiáveis.

domingo, 11 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (6)

__ Muitos conhecem os efeitos da depressão, mas poucos os da euforia causada por crises de bipolaridade. Você pode descrevê-la?

Eu gostaria de ser um psiquiatra para poder explicar melhor. Vou dar um exemplo hipotético. Começa com uma mania qualquer. Você pode ver uma luzinha insignificante e começar a achar que ali tem um duende conversando com você ou algo assim. Se não for ao médico correndo (demorei anos para saber que é preciso ir ao médico correndo), o negócio se alastra na sua cabeça. Daí a pouco o duende já virou um gênio e o gênio lhe dá idéias geniais e você passa a achar que é a pessoa mais genial do mundo, pode passar a alguma ação que lhe coloque em ridículo, pode até dar algum prejuízo à família, pois fica entusiasmado para comprar coisas de que não precisa. Enfim, você se sente bem demais e os que estão à sua volta se sentem mal com as suas declarações e as suas atitudes.

Eu digo no livro: jamais criei alguma coisa em estado de euforia que fizesse sentido depois de algumas gotas de Haldol. Haldol é o remédio que eu tomava para baixar o facho.

sábado, 10 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (5)

__ Até que ponto o ritmo de vida moderno pode propiciar as manifestações do transtorno bipolar?

Penso que isto depende de cada pessoa. No meu caso, estou sempre querendo inventar alguma coisa. Como costumam dizer, a mente é inquieta. Então, se a vida é urbana e o ritmo é frenético, eu quero inventar mais ainda.

Há muitos anos que eu não tenho uma depressão. E a minha última euforia, que mereceu internação, foi há mais de 15 anos. Tenho que estar bem medicado e com o sono em dia, caso contrário posso querer inventar algum absurdo. Em outras palavras, bem medicado a gente cria alguma coisa que pode até não ser bem sucedida, mas que tem lógica, e se os fatores externos ajudarem, se planejarmos bem, poderá dar certo. Entretanto, quando criamos em estado de euforia, nada se aproveita.

IMPORTANTE ENTENDER: bipolares ou não, medicados ou não, todos nós vivenciamos emoções diariamente. Tristezas, frustrações, mau humor, alegrias, vitórias e bom humor não são privilégios de ninguém. O que acontece com os bipolares é que as depressões e euforias podem ser muito mais intensas e nem sempre eles se dão conta disso.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

PSICÓTICA MANÍACA DEPRESSIVA É DOSE!

Resolvi escrever no feminino, pra variar um pouquinho. Tenho mais seguidoras neste blog do que homens. Na Ed. Record, quase todo mundo que fala comigo é mulher. Vou fazer uma promoção do livro no Pátio Savassi, em Belo Horizonte, todas as executivas são mulheres. É uma verdadeira invasão neste mundo que um dia supomos masculino. Como bom machão, acho que esse negócio ainda vai virar uma grande TPM, você vai ver só.

Mas não é disso que eu queria falar. Eu quero lhe perguntar o seguinte: você se casaria com uma psicótica maníaca depressiva? O Jô Soares disse que se fosse só maníaca ele topava. Mas que tipo de mania ele não disse... Agora, e se fosse só pra dar um empregozinho? Uma psicótica maníaca depressiva, você quer?
O preconceito é grande, minha filha. Ainda bem que melhoraram o nome: transtorno bipolar, menos mal. Mas, dependendo do seu comportamento, dependendo das suas depressões e das suas euforias (olha a mania aí, oh!), dependendo de como você aparece para a sociedade, o preconceito continuará existindo.
__ Fulana de Tal é meio pancada...

Então, estabilizador de humor nela. Medicamentos e psicoterapia – nada de negligenciar o tratamento! Vamos mostrar aos que nos cercam as nossas características positivas, vamos expressar o nosso potencial dentro de comportamentos aceitáveis.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (4)

__ Por muito tempo você trabalhou em agências de publicidade, um ramo competitivo em que a pressão sobre o profissional é muito acentuada. Como você lidou com algumas situações-limites do dia-a-dia do mercado publicitário?

Eu ainda trabalho em publicidade, embora não seja mais empregado de uma agência. Mesmo como free-lancer, a pressão pode existir. Em 99% das situações, lido muito bem com ela. Eu digo no livro: sou prático, comodista, aparentemente calmo e conciliador. Um por causa do outro, não sei o que vem primeiro. Mas há 1% das situações em que a paciência se esgota. Principalmente quando a dignidade é afetada, passo a uma violência verbal sem parâmetros. Uma pena.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

NADA É FÁCIL NESTA VIDA

A Koch Tavares tinha realizado o primeiro Hollywood Vôlei de Praia, em 1985, dentro de um profissionalismo inédito no Brasil para aquele esporte. E o patrocinador pediu, no maior entusiasmo:
__ Ano que vem vamos fazer Brasil x Estados Unidos. Os jogadores americanos tinham sido nossos algozes nas olimpíadas. Seria um tira teima.
As providências corriam a todo vapor, preparando aquele verão de 1986. Foi quando tarde da noite me ligou o Luis Felipe, da Koch Tavares.
__ Marcelo, os caras querem cancelar.
__ Cancelar o que, Luis?
__ O Vôlei, Marcelo. Eu já paguei mais da metade da conta, já mandei dinheiro para o agente americano, agora eles dizem que está caro e não querem mais fazer.
Eu não conhecia o novo gerente de comunicação da Souza Cruz, mas conhecia a psicologia da empresa, sobretudo o senso de justiça que norteava os negócios daquela época. Trocamos alguns telexes, fizemos uma reunião, abaixamos um pouco o preço: negócio fechado. E os americanos deram outro sabor à competição, foi um sucesso.

Pensa que acabaram os problemas? Veio o presidente da federação de vôlei, de dedo em riste, e ameaçou acabar com tudo se não fizéssemos o próximo com ele. Até que não foi tão ruim. A Souza Cruz saiu, mas entrou a Globo no lugar da Bandeirantes. A federação deu um gás e transformou a promoção em World Series, o esporte foi promovido em vários cantos do mundo e o que era uma brincadeira de praia virou esporte olímpico.

Mas, poucos anos depois, a Koch Tavares acabou perdendo o contrato de um esporte que começou com ela. Ficou só para a federação.

terça-feira, 6 de julho de 2010

TUDO COMEÇOU COM O BADAIÓCA

Eu já tinha avisado a Souza Cruz que ia me demitir para cuidar do marketing do Cometa Halley, veja só. Mas essa é uma outra história que eu conto em detalhes no meu livro... Eu tinha uma sociedade com a Koch Tavares nesse negócio do cometa e um dia apareceu por lá o Badaióca, jogador da seleção brasileira de vôlei, vice campeã olímpica:
__ Os jogadores vão estar de férias em janeiro, a gente reúne os melhores e faz um torneio de vôlei de praia: Renan, Montanaro, Isabel, Jaqueline – garanto que todos jogam.
Ato contínuo, sentei-me à máquina de escrever (estávamos em 84) e redigi o plano, bem ao gosto da Souza Cruz: Hollywood Vôlei. Jogos de duplas e quadras em Ipanema e Guarujá. Consegui convencer os colegas de que era bom negócio e a Koch Tavares produziu tudo direitinho.

Só deu um problema: a Jaqueline passou a viagem inteira de São Paulo a Guarujá criando um caso danado porque não estava recebendo direitos de televisão e a Bandeirantes ia transmitir. O bipolar turrão do lado de cá não teve dúvidas:
__ Então ela não joga!
(está se vendo que o problema talvez fosse mais comigo do que com ela).
A turma do deixa disso acabou vencendo. Ela era muito amiga da Isabel, que era a maior atração feminina do grupo. Ficaram com medo da Isabel não jogar também e conseguiram contornar a situação, coisa que eu é que devia ter feito.

Os eventos foram o maior sucesso, nas duas cidades. E a Souza Cruz ficou tão entusiasmada que pediu para fazermos Brasil x Estados Unidos no ano seguinte.

No próximo post eu conto o resto...

sábado, 3 de julho de 2010

Crônicas de Um Bipolar – interessante entrevista no Jô Soares

DUAS DERROTAS NO FUTEBOL

Eu sempre gostei muito de futebol. Desde criança. Meu time do coração é o Galo, de Belo Horizonte. E o amor é tanto que, mesmo depois de morar 33 anos no Rio de Janeiro, ainda não arranjei um time por aqui. Minha outra paixão sempre foi a Seleção Brasileira e o futebol arte de qualquer time: o Inter de Falcão, o Palmeiras de Ademir da Guia, o Santos de Pelé, o Botafogo de Garrincha, o Flamengo do Zico e... pasme você, até mesmo o Cruzeiro de Tostão, desde que não estivesse jogando contra o meu Atlético.

Porém, com o tempo o futebol virou correria e força – a gente passa um jogo inteiro de Copa do Mundo e vê até uns cortes, mas não vê um verdadeiro drible. E o Brasil, que sempre maravilhou o mundo com a habilidade dos seus craques, exportou quase todos para que eles desaprendessem lá pelas europas. Pior: arranjou um treinador que nunca soube muito mais que o desarme e ele, em nome de uma pretensa família, montou um time “europeu” com a camisa canarinho. Como exemplo, deixou por aqui nossos craques mais promissores, como Ganso e Neymar, para escalar a mediocridade de um Felipe Melo.

Perdemos para a Holanda e depois assistimos uma grande injustiça, que foi a eliminação de Gana. O uruguaio tirou a bola de dentro do gol com a mão. Não deveria ser gol de uma vez? Não, a regra mandava bater um penalty. E a bola bateu no travessão. Sacanagem com os jogadores, com a população de Gana, com a África e com a minha emotividade. E você, o que achou?

VEJA TAMBÉM O POST DE 16/6: PORQUE EU NÃO GOSTO DA SELEÇÃO DO DUNGA

sexta-feira, 2 de julho de 2010

PERGUNTAS QUE SEMPRE FAZEM (3)

__Como é o seu tratamento?

Hoje em dia eu tomo:
- Carbolitium 450 mg CR 2 vezes ao dia
- Tegretol 200 mg CR 2 vezes ao dia
- Rivotril – 1 mg ao deitar
Não tenho problemas de efeitos colaterais com esses medicamentos. Mas, se ingerir bebida alcoólica com Tegretol pode dar muito sono. Com Rivotril também potencializa o sono, mas pode causar efeito contrário. Tipo assim: tomar um porre numa happy-hour, tomar o Rivotril à noite, dormir pesado, depois acordar excitado no meio da noite. Tomar bastante água para diluir um pouco o álcool minimiza os efeitos. Álcool e Carbolitium não me causam problema algum, mas há que se levar em conta que o álcool, sozinho, tem lá os seus efeitos. Para mim, pode começar com uma agradável alegria, mas se for em excesso e surgir uma discussão sobre política, por exemplo, posso me exaltar nas palavras, o que não é nada bom.

Mas por favor, como já disse neste blog, cada caso é um caso. Não faça experiências sem conselhos médicos.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

VIOLÊNCIA ACONTECE

Como um grande comodista que sempre fui, costumava resistir às mudanças. E o meu lado turrão batia pé com a mais absoluta certeza.
__ Eu não preciso de computador. A gente sempre trabalhou sem isso, pra que eu quero essa merda?
Querendo eu ou não, implantaram os computadores na agência inteira, e quando eu mudei de agência lá estavam os desalmados, e era pra toda a vida. Pois numa determinada agência em que trabalhei, resolveram extrapolar. Implantaram um software “fuderoso” que controlava a agência inteira, do pedido de trabalho até o faturamento. Você não conseguia colocar um anúncio no jornal se não dominasse aquele maldito sistema.

No primeiro dia, disseram que a gente ia fazer um curso. Dividiram os empregados em grupos e me perguntaram em que turma eu preferia ficar.
__ Me dá o primeiro horário, que o bicho tá pegando.
Às oito da manhã, o instrutor começou pelo seguinte:
__ Em sete dias vocês dominam isso.
Depois declinou uma série de termos incompreensíveis, pelo menos pra mim. Ato contínuo, larguei a “aula” pra lá e fui cuidar da minha vida. Não sem antes comentar com um diretor que se demorava sete dias para aprender, não podia prestar. Acontece que aquele troço tinha custado uma nota e a diretoria não ia abrir mão dos benefícios de controle financeiro que ele proporcionava.

Como sempre existe uma solução na vida da gente, a minha estagiária estava aprendendo a mexer com o software e eu deixava a burocracia por conta de toda aquela ansiedade pelo saber. Mas ela ainda não estava dominando tudo. Foi quando o instrutor entrou na nossa sala, viu que ela tinha dado um comando errado e simplesmente desligou o computador da tomada. Ela ia ter que começar todo o exaustivo processo de novo, o que envolvia um anúncio para ser entregue naquele mesmo dia. Pulei da cadeira feito um bicho e saí esbravejando atrás dele. Percebendo que a violência não ia ficar só no verbal, ele correu escada abaixo comigo xingando atrás. Mais tarde, um diretor acompanhou o trapalhão até a minha sala para que ele pedisse desculpas. Não aceitei. Jamais aceitei, mas voltei a ser calmo.
Aí você pergunta: você fez isso porque era bipolar? Eu não era, eu sou. A personalidade não muda, o que muda é a intensidade das emoções. Talvez, se eu não estivesse tomando meus remédios, criasse um problema muito mais grave. Talvez também não readquirisse a calma.